Antes do advento da Lei 13.786/18 que trata da resolução de contratos de venda e compra por inadimplemento do adquirente da unidade imobiliária, havia muita discussão sobre a partir de qual momento incidem juros de mora.
Se você já torceu o nariz aqui vou te dizer que ainda existem ações anteriores a lei e que você precisa dessa informação.
O que decidiu o STJ?
Nos compromissos de compra e venda de unidades imobiliárias anteriores à Lei nº 13.786/2018, em que é pleiteada a resolução do contrato por iniciativa do promitente comprador de forma diversa da cláusula penal convencionada, os juros de mora incidem a partir do trânsito em julgado da decisão. STJ. 2ª Seção. REsp 1.740.911-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, Rel. Acd. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 14/08/2019 (recurso repetitivo – Tema 1002) (Info 654).
Vamos ao exemplo:
Em 2014 Angela celebrou contrato de promessa de compra e venda de um apartamento com a construtora CRG Engenharia. O promitente-comprador se comprometeu a pagar o imóvel em 60 prestações. Quando estava na 20ª parcela, Angela foi demitida o que fez cessar o pagamento das parcelas.
O pacto celebrado possuía uma cláusula penal prevendo que, em caso de resolução do contrato por iniciativa do promitente comprador, a construtora poderia reter 80% das prestações pagas, devolvendo ao consumidor 20% do valor pago, de forma parcelada em 12 vezes.
Angela não concordou com isso e ajuizou ação contra a CRG pleiteando a extinção da promessa de compra e venda do imóvel já que não tem mais condições financeiras para prosseguir com o pagamento das parcelas.
Na ação requereu:
- reconhecimento da abusividade da cláusula penal prevista no ajuste;
- a retenção pela construtora de apenas 20% das prestações pagas;
- a devolução de 80% do valor pago, de uma única vez, acrescido de juros e correção monetária.
Poderia Angela ter feito esses pedidos?
SIM.O STJ tem um súmula que trata sobre o tema, vejamos:
Súmula 543-STJ: Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.
O posicionamento do STJ (já temos post aqui sobre isso) esta no sentido de reconhecer a abusividade da cláusula de distrato que estabeleça a possibilidade de a construtora vendedora promover a retenção integral ou a devolução ínfima do valor das parcelas adimplidas pelo consumidor distratante.
A jurisprudência entende que é razoável que o vendedor retenha parte das prestações pagas pelo consumidor como forma de indenizá-lo pelos prejuízos suportados, notadamente as despesas administrativas realizadas com a divulgação, comercialização e corretagem, além do pagamento de tributos e taxas incidentes sobre o imóvel, e a eventual utilização do bem pelo comprador.
A jurisprudência normalmente considera razoável a retenção, pelo promitente vendedor, de um percentual que varia de 10% a 20% dos valores já pagos, devendo o restante ser devolvido ao promitente comprador. STJ. 4ª Turma. REsp 1.132.943-PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/8/2013 (Info 530).
Então beleza, mas esses valores que a construtora tem que devolver não tem juros nem correção?
Como sabemos os juros moratórios são pagos pelo devedor como forma de indenizar o credor quando ocorre um atraso no cumprimento da obrigação.
O contrato previa um percentual de restituição de apenas 20%. A sentença ampliou esse percentual para 80%. Diante disso, o STJ considera que a sentença que substitui cláusula contratual, sob esse aspecto, tem natureza constitutiva, com efeitos ex nunc, isto é, a partir da formação da nova obrigação pelo título judicial. A parte condenatória da sentença – restituição dos valores pagos após a revisão da cláusula penal – somente poderá ser liquidada após a modificação, pela decisão judicial, da cláusula questionada.
Sendo assim o termo inicial para contagem de juros de mora é o transito em julgado da decisão que determinou a devolução.
E a correção monetária?
A correção monetária das parcelas pagas, para efeitos de restituição, incide a partir de cada desembolso (STJ. 4ª Turma. REsp 1305780/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 17/4/2013). Em outras palavras, os índices de correção monetária deverão incidir a partir de cada parcela paga.
Atenção:
Em 28/12/2018, entrou em vigor a Lei nº 13.786/2018, que dispõe sobre a resolução do contrato por inadimplemento do adquirente de unidade imobiliária. A Lei nº 13.786/2018 acrescentou o art. 67-A na Lei nº 4.591/64 prevendo as consequências jurídicas para o caso de resolução do contrato por inadimplemento do adquirente.
Com essa lei foi previsto um percentual máximo das parcelas pagas que a incorporadora poderá reter a título de pena convencional:
Art. 67-A. Em caso de desfazimento do contrato celebrado exclusivamente com o incorporador, mediante distrato ou resolução por inadimplemento absoluto de obrigação do adquirente, este fará jus à restituição das quantias que houver pago diretamente ao incorporador, atualizadas com base no índice contratualmente estabelecido para a correção monetária das parcelas do preço do imóvel, delas deduzidas, cumulativamente:
I – a integralidade da comissão de corretagem;
II – a pena convencional, que não poderá exceder a 25% (vinte e cinco por cento) da quantia paga.
Assim, para os contratos celebrados (assinados) após a Lei nº 13.786/2018 não se aplica o entendimento do STJ acima exposto. Isso porque, com a Lei nº 13.786/2018, passou a existir no ordenamento jurídico regras para o percentual de restituição dos valores pagos. Logo, a sentença que determina a restituição, para contratos celebrados após a Lei nº 13.786/2018, não é uma sentença constitutiva, mas sim declaratória de nulidade de cláusula contratual e condenatória ao pagamento de valor.
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